ARTIGOS

 

 

As Depressões: Uma questão a partir da clínica com idosos*

Gisele da Silva Bandeira**

 

 


  Na experiência do trabalho com idosos, quer seja ele desenvolvido no ambulatório ou no âmbito das enfermarias do hospital, somos confrontados com uma constatação que logo se impõe: uma referência recorrente ao termo depressão. No percurso por um serviço de atenção a idosos - o NAI/UNATI1, revelou-se, desde o contato com as diferentes especialidades e seus discursos, a incidência marcante desse termo aliada a uma forte preocupação da equipe como um todo com a possível ocorrência de um estado depressivo em seus pacientes. Reflexo disso eram os inúmeros encaminhamentos à Psicologia, trazendo como indicação um diagnóstico de depressão ou, antes, uma interrogação sobre o mesmo. No viés da clínica, o que ficava indicado é que a referência à depressão ocorria de forma reiterada na queixa dos idosos: estes procuravam atendimento psicológico muitas vezes nomeando desta maneira o mal-estar que os acometia. Tornava-se evidente então, como algo que “salta aos ouvidos”, a pregnância dessa problemática em especial, e tomando em consideração as demais clínicas onde atuamos durante a residência, no que tange o trabalho com idosos. Deste modo, a dita depressão parece encarnar ali um inimigo à espreita, pronto a acometer qualquer um desses sujeitos que não esteja conduzindo lá tão “bem” as questões de sua vida ou as condições que se lhe apresentam com o envelhecimento.

Na trilha dessas indicações recolhidas da experiência surgem questões que nos levam a interrogar então essa constante alusão à depressão (ou o que se designa como tal) na clínica com idosos, ou antes, uma conjunção, por vezes naturalizada, entre velhice e depressão. A que isso viria responder?

A problemática dos fenômenos depressivos em si constitui-se de grande relevância, em especial se a circunscrevemos na conjuntura de uma instituição hospitalar. Para além dos muros do hospital presenciamos hoje uma tendência à banalização do diagnóstico de depressão, forjada na atualidade. Nos limites desta instituição configura-se um campo fértil para que a “depressão” se reduza puramente a uma questão de sintomatologia, avaliação diagnóstica e indicação medicamentosa, em uma certa “produção em série”, promovendo uma generalização que deixa de fora o que daí se reporta ao sujeito.

Em sua interface com a experiência do trabalho com idosos, a pertinência da questão se reafirma de modo que, abordando o que se evidencia desde a experiência clínica, da escuta, pode-se deixar incidir o que é da ordem do singular de cada sujeito, interrogando, dialetizando uma idéia que circula e toma espaço no discurso social, qual seja, a da existência de um vazio na velhice. As transformações ocorridas até o momento histórico atual onde o valor social do velho - este que está à margem do modelo que exalta a juventude e a produtividade - passa a ser associado à inutilidade e decrepitude, concorrem para tal concepção. A idéia de um “não resta mais nada” ronda e assombra esta etapa da existência transformando o velho numa espécie de sujeito em “suspensão”, sem projetos, e favorecendo um nexo naturalizado entre o idoso e o entristecer, o deprimir; não sem conseqüências. Este é assim muitas vezes lançado a uma vida sem sentido, numa marginalização do circuito do desejo. E por vezes, de fato, deprime, deixando mesmo em suspenso sua condição desejante. Porém, frente ao juízo de que pouco ou nada mais resta ao idoso diante das vicissitudes do envelhecer que não entristecer, o que atesta a clínica?

É na escuta ofertada e sustentada no dispositivo da clínica que poderemos, contudo, indagar sobre esse que nos chega trazendo em sua queixa a marca deste diagnóstico: qual a depressão que lhe concerne?

No discurso atual a magnitude com a qual o termo “estar deprimido” toma lugar, anunciado pela medicina, pelos indivíduos que, servindo-se dos rótulos ratificados pelo discurso científico, assim apresentam - e cada vez mais - seu estado d’alma, dá mostras da emergência de um novo olhar sobre os fenômenos depressivos. A depressão lida como mal do século se difunde e o significante generaliza-se, pretendendo recobrir as várias tonalidades de mal-estar do homem. Vemos então A depressão2 sendo sustentada como uma patologia com entidade própria, ou seja, que se define por si, em sua solidez, sendo-lhe conferida uma consistência tal que desconsidera a variedade de manifestações dos estados depressivos e, em última instância as marcas singulares que aí se imprimem. Algumas falas que circulam no âmbito do hospital ilustram bem o status de categoria diagnóstica que faz da depressão algo que explica e subsume uma série de manifestações do sofrimento humano e que sendo propagada como mal a ser erradicado, ou até drama a ser prevenido é algo que se impõe ao sujeito sendo reportável antes à química do cérebro que, descompensada em suas taxas hormonais o faz adoecer, ou talvez a um mundo que o agride com seus “fatores ambientais desfavoráveis”. Uma paciente acompanhada em um dos ambulatórios do HUPE diz temerosa: “Não sinto vontade de fazer nada, disseram que pode ser depressão”. Então a depressão, tal como a gripe, apenas se instala sem guardar relação alguma com as questões de sujeito que acossam cada um?!

Num contraponto a tal perspectiva o discurso analítico sustenta a idéia de estados depressivos. Longe da categorização promovida trata-se antes de estados que ocorrem em algum momento da vida; momento que se inscreve na trama do sujeito, guardando íntima relação com sua história. Se a depressão nada pode dizer a priori na clínica, devemos escutar o que uma manifestação depressiva que integra o repertório dos sofrimentos endereçados pelo paciente pode apontar em termos de sua posição subjetiva. Lá onde a depressão tratada como um signo preenche de sentido, a possibilidade é que à medida que vá sendo falada, haja um esvaziamento desses sentidos “prontos” e uma conseqüente singularização pelo discurso de cada um.

A psicanálise faz de sua prática uma experiência do sujeito e, portanto, da diferença, do singular. Trata-se do sujeito do inconsciente. Quando, como psicanalistas, falamos do velho, falamos desse sujeito marcado por uma realidade psíquica. Velho e velhice remontam, antes, a representações sociais enraizadas em nosso tempo histórico. No que diz respeito à clínica, a velhice só pode ser concebida desde a relação de cada sujeito que lá se apresente com esse momento da existência humana. Assim, a variedade de insígnias ligadas à condição de ser velho apenas pode ser tomada na perspectiva de sua incidência enquanto significantes que, como tais, só ganham sentido no particular de cada cadeia. Rugas, cabelos brancos, impotência sexual etc, são significantes que tomam sentido pela maneira como se inscrevem para cada um. O envelhecimento é um processo que impõe uma tomada de posição, e cada sujeito responderá a ele com recursos próprios, no particular dos traços de sua história.

Para além do velho estilizado socialmente, o que a experiência clínica traz à cena é então um sujeito com seus modos de se arranjar e conduzir o que se apresenta em sua existência. Que é atravessado pelo Outro, pelo campo do desejo. Há questões atemporais pertinentes ao sujeito; a temporalidade peculiar ao inconsciente circunscreve um sujeito que não envelhece. No entanto, não se trata de desconhecer a existência de questões e eventos que tomam lugar de modo privilegiado no devir do envelhecimento. As freqüentes queixas de sentimento de solidão e de sentir-se entristecido, um certo esgarçamento das relações, a transformação nos papéis social e familiar, a memória que falha e preocupa; tudo isso é muito familiar àqueles que chegam nos direcionando suas falas nessa clínica em especial. O que disso pode ganhar direção e ser reordenado pela palavra é algo a ser verificado a cada vez.

O processo de envelhecimento é inexorável e vem acenar de algumas formas para indícios do real em jogo – marcas do não-todo, limites impostos pela castração. A velhice atualiza a castração por diferentes vias: o confronto com a questão da finitude; o real de várias perdas que, embora permeiem outras etapas da vida, tornam-se uma questão mais complexa quando se trata do idoso pela sua magnitude, além do fato de que com freqüência são sucessivas e, mais do que isso, concomitantes. As transformações da imagem podem horrorizar o sujeito, bem como o porte das perdas afetivas – o cônjuge de tantos anos que falece, os filhos que saem de casa, parentes, amigos; por vezes todos se vão. Também a perda dos laços de trabalho, ou no nível do corpo que não goza mais do vigor físico são perdas de referências importantes nas quais se apoiava o sujeito; referências simbólicas, ideais que vão desmoronando e requerem novas inscrições, exigindo para tal trabalho de elaboração. É preciso que o idoso se situe a partir de novas insígnias, elaborando o luto do que poderia ter sido e do que foi, o que evidencia a importância de um remanejamento simbólico no campo dos ideais.

De qualquer modo a velhice implica em realizar lutos - o que pode propiciar alguma retomada de laços - em construir novos ideais. A aposta é sempre essa. Quando isso não pode se dar, deprimir é uma direção que evidencia o trabalho inoperante do luto.

Se, de alguma forma podemos pensar que os estados depressivos tendem a surgir de modo mais incisivo na velhice é justamente em função do excesso, da concomitância de perdas significativas, diante do que não é evidente que alguém possa se sustentar frente às questões do desejo; este que nos move. Contudo, nunca podemos perder de vista que os estados depressivos não podem estar atados à velhice como um destino comum; não lhe são inescapáveis. A experiência clínica dá provas da potência de um trabalho de luto e da importância e possibilidade da abertura ao caminho do desejo – esse que é indestrutível – seja lá em qual idade for.   

Para finalizar, gostaria de apresentar aqui algumas reflexões advindas da prática clínica referenciando-me no universo do atendimento a idosos nas enfermarias do HUPE e suas interfaces com a questão das depressões e como ela está circunscrita neste contexto.     

A inserção do psicólogo como integrante da equipe do NAI/UNATI nas enfermarias se dá em duas enfermarias – masculina e feminina – de Clínica Médica. Nelas são recebidos pacientes de diferentes idades, em sua maioria para investigação diagnóstica ou por intercorrências (uma descompensação ou alteração no estado geral de uma doença geralmente crônica) e a equipe multidisciplinar do NAI ali responsabiliza-se por fazer o acompanhamento apenas dos pacientes idosos.

Cabe ressaltar, em primeiro lugar, sobre o trabalho realizado no contexto hospitalar, as demandas que os profissionais da psicologia são chamados a responder – peculiaridades do arranjo institucional. As solicitações vindas de todas as partes - equipe, familiares – à psicologia, trazem uma expectativa de que nos cabe confortar, aconselhar, preparar enfim paciente e família para a internação e suas intercorrências. Isso muitas vezes indica um pedido de adaptação do paciente ao que se impõe como regra considerada normal, o que num hospital geralmente tem a ver com uma complacência, de preferência toda, aos cuidados prestados. Assim, nos convocam de modo geral a intervir seja apaziguando, contendo o que escapa ao controle, às orientações, abafando o sofrimento do paciente e como conseqüência o que disso retorna para a equipe (seu próprio mal-estar); seja comparecendo com uma resposta que, fruto de um saber sabido, remova questões que fazem limite ao saber dos outros discursos, esclarecendo então o que falta a algum caso.

Chamados então a lidar com o que ultrapassa a trama do orgânico e perturba, ficamos com o que não é da alçada do médico ou até mesmo o é, mas gera muita angústia; com o que não anda quer seja porque impede que o trabalho da equipe flua adequadamente, ou porque faz limite ao saber com o que os outros profissionais contam.

Nisso, nada de novidade. A questão é do nosso lado. Ora, se nos conferem esse lugar numa instituição, e essa via das demandas é por onde se pode defini-lo, cabe interrogarmo-nos de onde iremos responder (e não quero dizer atender) ao que demandam. E diante do que daí se mostra incompatível com o lugar que visamos sustentar, como fazer valer nosso trabalho, ou antes, como não cair no descrédito. Se num hospital geral não nos alinhamos com a lógica das resoluções imediatas e eficazes, do aplacamento do mal-estar, como afirmar o que é característico de nossa prática clínica?

Certamente a experiência do caso a caso nos dá margem maior para responder isso. Contudo, o que é uma constante na variedade das situações é que a exigência de se tecer um trabalho na tensão do entre-discursos requer manejo. Requer manobrar entre o que é imputado a nós, em termos de saber especializado, em termos de cumplicidade com as respostas padronizadas, e a decisão de não ceder de uma posição que valoriza a fala do paciente e aponta a emergência da dimensão subjetiva.

Essa expectativa de aplacamento do mal-estar incutida nas demandas toca diretamente a questão da depressão enquanto fortemente presente nas enfermarias nomeando as mais diferentes situações. Em nossa prática, verificamos constantemente a interligação de ambas nos constantes pedidos de parecer e encaminhamentos à Psicologia. A “depressão” como um fantasma, parece estar sempre à espreita na enfermaria; diante do que podemos refletir sobre as nuances desse enquadre quando se trata da internação de um paciente idoso. A lógica acima descrita talvez tenha efeitos ainda mais potentes sobre o idoso se considerarmos que já lhe recai a idéia de um nexo naturalizado com os estados depressivos por circunstâncias que já apontamos outrora. Em uma internação hospitalar, pela evidência da doença escancarando algo do limite, o idoso, nas vicissitudes do envelhecimento que relançam a um embate com algo da finitude, parece ser por vezes envolvido de uma maneira potencializada em uma aura de fragilização e decrepitude - referências que recobrem um certo horror que a velhice causa.

Num atendimento a uma senhora hospitalizada um impasse e muito mal-estar ganham a cena na enfermaria. Aquela mulher de 72 anos, a quem os médicos atribuíam uma depressão, em função de sua postura de recolhimento, teve, após investigação, diagnosticado um câncer gástrico já num estágio avançado. Entretanto, ela nada queria saber sobre seu estado. Chegou a manifestar isso sem rodeios. Desde que chegou, nenhum questionamento sobre exames ou, procedimentos, partiu dela. Nunca cobrou sequer alguma resposta dos médicos para suas dores, seu emagrecimento brusco, seus episódios de vômito com sangue. A que esse desinteresse viria responder?

Nos atendimentos com a psicóloga dizia-se bem, elogiava os cuidados da equipe e, em meio a um discurso sempre religioso, afirmava, numa referência aos acontecimentos: “Deus é quem sabe”. Ou, eventualmente, “os médicos é quem sabem”. Essa posição onde nada parecia lhe dizer respeito, não demandando saber algum, se repetia, ao longo dos atendimentos. A maioria deles curtos–como num recurso diante do que ela sinalizava de um fechamento ao trabalho.

Mas que demanda da parte dela? O que autorizava um retorno a seu leito para escutá-la? Era preciso algum tempo e nele fazia-se fundamental não perder de vista que ela não tinha que falar, independente de quão grave era sua situação, mas que ela podia falar, e a escuta estava ali para assegurar isso. Mantendo a oferta de escuta, atenta ao que podia advir nas entrelinhas, a psicóloga presenciava seu retraimento – excesso de sono, vazio de demanda de saber. Movimento da libido que se retira do entorno.

Diagnóstico definido, médicos preocupados. Tomavam decisões a respeito de que terapêutica seria viável e expunham seu limite: não sabiam o que fazer com alguém que não quer saber do seu câncer. “E se for indicada uma cirurgia? Como tratá-la nestas condições?”, pensavam. Alguns profissionais dirigiam à psicóloga uma demanda onde figurava implícito um pedido de que esta interviesse “ajudando-a” a tomar conhecimento. Julgavam que a paciente só poderia investir em seu tratamento, ajudar a si mesma, estando a par de sua enfermidade. Em última instância, esperava-se que a psicologia ajudasse a paciente a ficar bem. A tentativa nos atendimentos era, numa perspectiva diversa, ir sustentando a pergunta se havia algo a dizer por parte dela. Pois se a aposta é exatamente essa, como se afinar com a lógica do bem para o outro? Não estar disposta a saber e, por conseqüência, não se cuidar era lido como natural de sua condição de deprimida, concluía-se. Donde a demanda de que era necessário um tratamento psicológico que desse conta da depressão.

Neste contexto delicado, o que cabia era manejar a situação de modo a produzir uma fenda entre o que se fazia questão para equipe – saber ou não saber, cuidar-se ou não - e o que dali podia se abrir como questão para aquela senhora. O manejo era o que permitiria, numa abertura onde se pudesse valorar sua fala, deixar margem para o sujeito se localizar, viabilizando algum trabalho. Apontavam a depressão, mas fazia-se necessário um tempo no qual esse estado depressivo de resposta passasse à pergunta, inserida numa rede que o fizesse significar algo para o sujeito.

Era preciso, dialogando com a equipe, fazer incidir uma dimensão da temporalidade que permitisse “transitar” entre um tempo de espera e pressa: uma espera necessária para ouvir o que ocorre, aguardando os efeitos daquilo para a paciente, apesar da pressa, própria de um hospital, em fechar conclusões e passar aos agenciamentos práticos. Tempo de escuta – escansão necessária -, onde ao contrário de extirpar o mal-estar que se instaura, apostar que algo do que o perpassa pode ser alçado à categoria de enigma, de questão.

Fazer falar essa diferença da subjetividade do paciente é a aposta. Por outro lado, sustentar esse tempo de espera no manejo com a equipe é das tarefas mais difíceis nesse lugar de rápidas providências e de atos que ganham um certo ar de salto no escuro dada a total falta de garantias.

Num momento posterior, recebe alta com indicação de tratamento radioterápico no ambulatório. Nenhuma palavra por parte da equipe mencionando de que doença se tratava. Retorna logo depois à enfermaria por sentir-se mal, é quando retornam os atendimentos. Diz que as coisas vão indo devagar. E complementa: “As coisas chegam com tanta pressa, mas para ir embora demoram”. Indicação da velocidade com a qual as coisas a atingiram e da suma importância de um tempo de espera. Diante do convite a falar mais responde que não vai saber dizer, pois “tem coisas na vida que não se sabe nem explicar”. Parecia testemunhar o encontro com um indizível, que se presentificava a partir da marca em seu corpo. Ela tentava com seus próprios recursos simbólicos bordejar algo que não podia compreender. Passa a queixar-se das inúmeras injeções que invadiam seu corpo, de seu cansaço, do desejo de ir para casa. Parecia começar a posicionar-se frente ao que estava em jogo, nomeando o seu vivido. Tentativa de fazer face ao que se apresentava.

Fala de sua vida, de momentos anteriores à doença. Era muito ativa, cuidava da casa e dos netos. Lembra de quando os filhos eram pequenos e do quanto foi ruim por vezes ter que deixá-los sozinho. “Mas agora não tenho mais filhos pequenos...”, acentua. Nota-se, desta vez, uma chance de abertura ao trabalho.

O que pode a oferta de uma escuta analítica é, na contramão da generalização que preenche de sentido, viabilizar que haja um esvaziamento em prol das questões singulares que se apresentam por meio do dito de cada sujeito, desmistificando a entidade depressão e convidando o sujeito a contar sua história, a tecer suas articulações, implicar-se em sua fala, formular questões.

Sobre esses, a quem somos chamados a “avaliar”, a despeito de serem tão falados pelo outro, nada sabemos, mas sim são eles que, a certa altura supõem-nos saber.

O manejo é a via por onde podemos nos mover para ir sustentando nosso trabalho. E sabendo que ali, sobretudo na enfermaria, as intervenções visam o mínimo: o mínimo que possa mover o sujeito de uma posição de objeto de intervenção, de alienação aos rótulos, fazendo-o lançar mão de seus próprios recursos para cuidar do que é seu. 

Pensamos que se a velhice relança e atualiza um confronto com a finitude, por diferentes vias, a internação hospitalar vem potencializar essa radicalidade da incidência do limite. É nesse contexto que não raras vezes podemos testemunhar, com a escuta, a força com que a presentificação de algo desse limite é propiciador de uma revisão, um balanço da vida, uma precipitação de questões comumente referentes à vida e não à morte. Essa releitura que o idoso faz de sua trajetória, que será um a um, pode abrir o caminho para uma mudança de posição em relação a certos pontos de sofrimento. O resultado é então que, por vezes, sustentar esse trabalho permite uma melhor localização do sujeito frente ao que lhe faz sofrer.

 

Referência Bibliográfica

MUCIDA, A. “O Sujeito não envelhece”. Psicanálise e Velhice. Rio de Janeiro: Autêntica, 2004.

 

 

Notas

* Trabalho desenvolvido no Núcleo de Atenção ao Idoso (NAI/UNATI), supervisionado por Glória Castilho e apresentado no XI Fórum de Residência em Psicologia Clínico-Institucional, em setembro de 2007.
** Psicóloga, Residente do 2º ano do Programa de Residência em Psicologia Clínico-Institucional do IP/HUPE/UERJ.
1 O Núcleo de Atenção ao Idoso da Universidade Aberta da Terceira Idade, NAI/UNATI, é uma área de atuação dentre outras oferecidas pela Residência em Psicologia Clínica Institucional do HUPE/UERJ. A inserção em tal serviço foi o que constituiu as bases para reflexão do tema do presente trabalho. 
2 É Quinet (2002) quem faz esse uso do artigo em letra maiúscula – A depressão – para sublinhar o caráter de entidade absoluta a que a leitura atual faz corresponder os estados depressivos. Leitura que deixa fora de consideração as questões subjetivas.